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Piri. Esse é o apelido carinhoso
de Pirenópolis, cidade colonial goiana fundada no século XVIII. O apelido é
usado apenas pelos íntimos, mas não há razão para se preocupar: basta caminhar
um pouco pelo seu pequeno, belo e preservado centro histórico que você logo
estará se sentindo em casa. O roteiro sugerido é de três dias, que são
suficientes para conhecer as principais atrações da cidade.
1º dia: Batendo perna por Piri
Deixe o carro na pousada e saia a
pé. Para começar a ter uma noção do charme da cidade, vale começar o passeio
pela Igreja do Bonfim, encarapitada
no final da Rua do Bonfim. Aberta apenas aos finais de semana, a pequena igreja
concluída em 1754 te dá a rara oportunidade de subir ao altar principal e fazer
parte da decoração. A partir dali, a pedida é descer a Rua da Aurora,
arborizada e com casario colonial preservado. Dependendo do horário, vale a
pena parar na Florinda Comidinhas e
tomar um café enquanto lê um dos livros e revistas disponibilizados aos
clientes em uma enorme mesa. A Rua da Aurora também é casa da cervejaria Santa Dica, que fica “hospedada” em uma
singela construção que, não fosse a pequena placa na fachada, não daria nenhuma
dica de que se trata de uma cervejaria. Se o local estiver fechado, como estava
quando por lá passamos, não há motivo para histeria: a cerveja é facilmente
encontrada nos estabelecimentos da cidade. Os três estilos oferecidos são
deliciosos, testados e aprovados por estes que vos falam.
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Fê igual político na Igreja do Bonfim |
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Chris fazendo parte do altar mor da Igreja do Bonfim |
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Fê e a arborizada Rua da Aurora |
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Chris gastando o francês na Florinda Comidinhas |
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Fê tenta ver se sobra umazinha na cervejaria Santa Dica |
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Os três estilos e as lindas garrafas da Santa Dica |
As
Cavalhadas
Provavelmente a essa altura você
já terá esbarrado com uma das marcas de Piri: as representações dos mascarados,
personagem típico das cavalhadas, celebração de origem portuguesa que acontece
durante a Festa do Divino. Em Pirenópolis essa tradição é levada muito a sério,
e as estátuas estão espalhadas por toda a cidade. Os mascarados saem pelas ruas
da cidade durante os festejos (que acontecem 50 dias após a Páscoa), quase
sempre representando um boi, fazendo algazarra e disfarçando a voz, pedindo
cerveja ou dinheiro a quem estiver por perto.
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Sr Mascarado, desse aí o senhor não arranca cerveja nenhuma |
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Chris descobrindo Pirenópolis |
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Os mascarados de Piri dão instruções de como chegar |
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Chris e um mascarado patriota |
Um bom lugar para se iniciar na
tradição da Festa do Divino é o Museu do
Divino, que fica na antiga Casa de Câmara e Cadeia. Para chegar até lá
basta seguir pela Rua da Aurora, e atravessar a Praça do Coreto. No museu é
possível entender o funcionamento da festa, assistir a vídeos e apreciar as
roupas e adereços usados pelos participantes. As cavalhadas são o ápice dos
festejos, e acontecem no Campo das Cavalhadas. Montados em cavalos, artistas
representam a luta entre mouros (vermelhos) e cristãos (azuis) pelo domínio da
Península Ibérica. Embora haja torcidas para ambas as cores, aqui o resultado é
sempre o mesmo: os cristãos vencem e convertem os mouros ao cristianismo.
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Chris na entrada do Museu do Divino |
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Fê observa mais alguns chifrudos no Museu do Divino |
Igreja,
compras e paçoca de pilão
Saindo do Museu do Divino, será
impossível não ver a vermelhaça Ponte do Carmo, cruzando o Rio das Almas com
suas águas lamacentas. Não se intimide e faça a travessia. Do outro lado está a
Igreja do Carmo, que guarda em seu
interior um pequeno Museu de Arte Sacra.
Não se espante ao notar que os altares laterais estão sem imagens de santos. É
que eles vieram da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, que foi
demolida, e ficava no local onde hoje está a Praça do Coreto. Essa mesma igreja ainda aparecerá mais à
frente nesse relato, e de forma ainda mais importante.
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A vermelhaça Ponte do Carmo |
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E depois da ponte vem a Igreja do Carmo |
Colada à Igreja do Carmo está uma
construção grande, com paredes de pedra. Em sua fachada estão os dizeres
“Tecelagem. Aldeia da Paz. Casa das avós”. Não segure a curiosidade e adentre
seus portões abertos, para descobrir uma espaçosa loja de artesanato, cujos lucros
vão para o convento, creche e casa de idosos que ali funcionam. Não será necessário um grande esforço
solidário para sair dali com algumas lembrancinhas a tiracolo.
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Chris pronta a adentrar a Aldeia da Paz |
Subindo pela Rua do Carmo, à
direita da igreja, chega-se rapidamente ao Restaurante da Dona Cida, que
ostenta orgulhoso em sua fachada o fato de sua cozinheira homônima ter ensinado
a receita de paçoca de pilão no programa da Ana Maria Braga. Gostando-se ou não
da apresentadora, é quase impossível não gostar da paçoca. Instale-se no belo jardim
dos fundos e acompanhe a paçoca com uma porção de carne serenada, o equivalente
goiano da carne de sol, e uma cerveja geladinha. Difícil vai ser ir embora.
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Muito orgulho na fachada da Dona Cida |
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Chris e a paçoquinha que vale todo o orgulho |
Uma
igreja sem altar-mor e um altar-mor sem igreja
Depois do refestelo na Dona Cida,
está na hora de conhecer a principal atração histórica de Piri: a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Rosário.
Antes mesmo de entrar na igreja vale observar a vista que a partir dela se
descortina, já que a construção está num ponto elevado da cidade. É a primeira
igreja do estado de Goiás, e sua fachada simples esconde uma história trágica
que, como quase toda história trágica, também está repleta de beleza.
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Chris e a bela vista que da igreja se descortina |
Construída no século XVIII, durante
a pujança econômica trazida pelo garimpo, a igreja foi ficando abandonada à
medida que o ouro deixou de ser encontrado na região. Com o abandono veio a
natural deterioração, estancada no final da década de 1990, quando a construção
foi totalmente restaurada à sua forma original. Mas não durou muito. Em 2002,
apenas três anos após o fim das obras, um incêndio destruiu 90% da construção,
restando apenas suas paredes. Eis que,
novamente restaurada, mas sem altar-mor, a nova igreja matriz recebeu o
altar-mor da Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos, guardado por 60
anos desde a demolição de sua casa original. A tragédia lhe deu um novo lar e,
mais bonito ainda, um belo simbolismo, ao unir a igreja dos brancos e dos
pretos em um mesmo lugar.
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Chris e a matriz |
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Chris e o altar mor que ficou sessenta anos esperando uma nova casa |
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Fê e um dos pedaços que não sucumbiram ao fogo |
Aproveite o fim de tarde para
bater perna nas proximidades da igreja matriz. Dá para conhecer o simpático
prédio do Teatro de Pirenópolis, na
rua lateral da igreja (que estava em obras de restauro quando fizemos nossa
visita). Pegando a Rua Direita, que fica, pasmem, à direita da igreja, chama a
atenção o prédio azul do Cine Pireneus -
que serve apenas para tirar uma foto, já que não tem visita interna. Um pouco
mais à frente na mesma rua está o Projeto
Memorial das Cavalhadas, tocado pela simpática Dona Célia, cuja família
participa ativamente das cavalhadas há décadas. A visita ocorre na casa da
família, e segue por duas salas repletas de fotos, fantasias e adereços usados
na festa.
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Fê mostrando sua satisfação com as obras no Teatro Pirenópolis |
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Fê e o Cine Pireneus, aquele que só serva pra foto |
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Fê imitando os mascarados no Projeto Memorial das Cavalhadas |
2º
dia: Sai pé-de-moleque, entra estrada de terra
Além de toda sua carga histórica
e cultural, Pirenópolis também é famosa pelas suas atrações ao ar livre. São
várias as cachoeiras da região. Para conhecer algumas delas, partindo do Bairro
do Bonfim, pegue a Estrada dos Pirineus. Antes de chegar às cachoeiras, não
deixe de dar uma parada no Mirante do
Ventilador, de onde se tem uma vista acachapante de Pirenópolis.
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Mirante do Ventilador, com Piri lá embaixo (os periquitos são brinde) |
Reservas
ecológicas
Após 6km na mesma estrada, pegue
a saída para a Reserva Cachoeira do
Abade. Após mais 4km de terra você chegará à portaria, onde poderá escolher
entre uma trilha curta de 400 metros que leva direto à Cachoeira do Abade,
passando pela Cachoeira do Cânion, ou outra mais longa, de 2,5km, que passa por
cenários diversos do cerrado e culmina nas mesmas cachoeiras. Ambas custam o
mesmo preço (R$ 30 por pessoa), portanto, a não ser que você realmente não
goste de andar, vale optar pela trilha mais longa, que passa por belas
paisagens e uma ponte pênsil apelidada de “ponte da tremedeira”.
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Chris feliz, saudando a natureza |
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Chris ajudando a paisagem da Cachoeira do Sossego |
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Chris na trilha em meio à mata - mas sem perrengue |
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Chris e um perrenguinho, vai, pra passar a Ponte da Tremedeira |
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Fê num momento complicado, perto da Cachoeira do Cânion |
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O casal no ponto final do passeio: a Cachoeira do Abade |
Voltando pela mesma estrada de
terra, pegue a saída para a Reserva
Ecológica Vargem Grande (R$ 35 por pessoa), lar das belíssimas cachoeiras
de Santa Maria e Lázaro. A primeira é alcançada por trilha de apenas 190
metros, e já valeria a viagem, com sua prainha de areia fina em frente à
pequena queda d´água. A estrutura é tão boa que tem até salva-vidas, já que o
poço é fundo e o banho proibido no local onde a água cai. Outra trilha, de
apenas 1,3km, leva até a Cachoeira do Lázaro, um espetáculo de águas caindo
irregulares por grandes pedras, formando belos desenhos. A melhor parte: é
possível ir caminhando até as quedas, já que aqui as águas são rasinhas.
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Chris decidindo para onde vamos...pras duas! |
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Chris no pequeno paraíso da Cachoeira de Santa Maria |
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Chris na trilha calçada à prova de sedentários |
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Chris e a esfuziante Cachoeira do Lázaro |
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Fê mostrando que dá pra chegar pertinho da Cachoeira do Lázaro |
Vale um aparte importante sobre
as reservas: fizemos todos os passeios de chinelo. Isso dá uma dimensão de como
a aventura é tranquila e indicada para todas as idades. Todas as trilhas são
calçadas em quase toda sua extensão, dando pouca margem à acidentes. Melzinho
na chupeta.
Motos,
bicicletas e otras cositas
No retorno à cidade, passando
pelo Bairro do Bonfim, não deixe de dar uma parada no Museu Rodas do Tempo . Dedicado à história dos veículos de duas
rodas, o museu é um brinco, muito organizado, e em seus cinco galpões temáticos
expõe dezenas de veículos e curiosidades até mesmo para quem não liga a mínima
para motos e afins. Mas até comentei com a Chris que o momento de viajar é aquele em que nos interessamos
até mesmo por assuntos pelos quais não nos interessamos normalmente. É uma das belezas de viajar.
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A entrada para as Rodas do Tempo |
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Chris admira as bicicletas bem normais |
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Fê e uma bicicleta alemã da segunda guerra |
De volta à cidade, e após um merecido
descanso, vale passar a noite em um dos muitos restaurantes e bares da Rua do
Lazer, um trecho da Rua do Rosário que fica fechado para carros e fica
preenchido por coisas muito mais interessantes: mesas, cadeiras e gente. Uma boa pedida por ali é o Restaurante
e Cachaçaria Dill que, como o nome indica, tem, além do cardápio
tradicional, degustação de dezenas de cachaças do Brasil inteiro. Também é um excelente lugar para provar as cervejas da já citada cervejaria Santa Dica. Vale lembrar
que a rua também funciona no horário de almoço, e pode ser um bom refresco para
o calor do centro-oeste. À meia-luz ou com sol a pino, trata-se de um dos lugares mais charmosos da cidade.
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Chris na Rua do Lazer, com sol a pino |
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O casal à meia-luz, com algumas cachaças |
3º
dia: Entre a fazenda histórica e o santuário ecológico
É bom programar este dia para um
sábado ou domingo, quando a primeira atração, a Fazenda Babilônia, funciona regularmente (durante a semana é necessário
agendar a visita). Para chegar até lá é
preciso pegar a estrada GO-431, e rodar por cerca de 24 km. Uma vez na
sede, há duas opções de visita: simples (R$ 22 por pessoa) e com café sertanejo
(R$ 78 por pessoa). Caso opte pela segunda opção, não tome o café no seu hotel,
já que se trata de um verdadeiro banquete com dezenas de pratos goianos.
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Chris na entrada da Fazenda Babilônia |
A visita guiada passa pelos vários
cômodos da construção, que já está bem modificada em relação à sua forma
original do princípio do século XIX, quando funcionou como engenho de açúcar.
Não é daquelas visitas “decorebas”, em que o guia parece estar lendo tudo que
fala. Parece mais um bate papo informal, em que a guia Daniela dá margem para
que os turistas façam perguntas e tirem suas dúvidas. Muito agradável. Mais
agradável ainda é ter a sorte de encontrar a dona da fazenda, Dona Telma,
mulher de conversa fácil e que demonstra genuíno prazer na milenar arte de
bater papo. Durante nossa conversa ela disse que fez curso no SEBRAE para
tratar com turistas, onde lhe aconselharam a ser mais formal - conselho que ela
sabiamente ignorou.
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A guia Daniela explica umas coisinhas pra Chris |
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E o Fê troca ideia com a Guia Daniela dentro da capelinha da fazenda |
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Chris e o belo boi galhudo, ou galheiro, sei lá |
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Chris e Dona Telma, com sua deliciosa informalidade |
Uma
pausa à beira-rio
De volta à cidade - e caso você não tenha
participado do café sertanejo - uma boa pedida para o almoço é o
Montserrat. Pertinho do centro da
cidade e à beira do Rio das Almas, o restaurante do chef catalão Juan
Pratginestós aposta, como ele mesmo diz, em uma “cozinha medieval com sabor goiano”.
Para mais detalhes do restaurante, leia nosso texto sobre a experiência em
nosso outro blog,
aqui.
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Chris na entrada do Montserrat |
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O casal pronto para um deguste no Montserrat |
Um
santuário cheio de delícias
Depois do almoço, hora de pegar a
estradinha de terra que leva ao Santuário
de Vida Silvestre Vagafogo, acessada a partir do Bairro do Carmo. Se der
sorte você será atendido pelo simpático, e falante, Uirá, um dos donos da
propriedade. Ele vai te contar sobre sua família, que é dona da propriedade há
décadas, e explora o turismo há 22 anos. Ele também te explicará sobre a trilha
circular de 1,5 km, que margeia o Rio Vagafogo e passa por pequenas
cachoeiras, piscinas naturais e árvores centenárias. E, mais importante de
tudo, te proporcionará uma degustação com as dezenas de delícias produzidas ali
mesmo na fazenda, como geleias, chutneys, pestos e muito mais. Vai ser difícil
ir embora sem levar nada.
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Chris em um trecho da trilha fácil |
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Chris em pose de revista em uma pequena queda d´água |
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O casal e a figueira tiazona, de mais de trezentos anos |
No local também é possível
participar do brunch ou fazer o
Circuito de Aventuras (com rapel, tirolesa, arvorismo, etc). Para ambos os
casos é importante ligar antes para saber da disponibilidade.
Embora esse roteiro tenha chegado
ao final, ele não esgota as possibilidades que Pirenópolis oferece aos seus
visitantes. Com uma junção irresistível de natureza exuberante e história
preservada, a cidade é uma gema dourada a ser descoberta. E a boa notícia é que
não é preciso experiência em mineração para aproveitar tudo que a cidade tem
para oferecer.
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Apenas uma das delícias de Piri |